quarta-feira, 6 de outubro de 2010

O "Índio Véio" sai de cena


O celular do meu marido despertou exatamente as cinco e meia da madrugada de domingo, dia 03 de outubro. Eu já previa que o dia seria agitado , não só pelo fato de ser eleições, mas eu sentia que algo diferente estava acontecendo. Sem titubear, coloquei o travesseiro no ouvido e virei-me para o canto da cama na esperança de retomar o sono. Pura ilusão. Foi quando ouvi ele dizer: o Paulo morreu, acabei de ler a mensagem no celular.

Por um momento pensei em perguntar, que Paulo? Mas eu já sabia  que o Paulo Ubiratan estava na UTI. A partir daí não consegui mais dormir. Levantei uma hora depois. Um breve café da manhã. Em frente o guarda-roupa optei por calça e camiseta preta. Peguei os óculos escuros, um guarda chuva, dei um beijo em cada um dos filhos e fui a caminho do velório.

A cada passo uma lembrança, uma cena, um flashback. Parecia estar ouvindo sua voz grave dizendo a cada manhã: trabalhador, trabalhadora, pense nisso! Tantas histórias pra contar. Meu primeiro emprego no rádio foi na Alvorada em 1.988, quando conheci Paulo Ubiratan. Ele queria implantar o jornalismo na emissora, só que o padre diretor, não era muito favorável a idéia. Por conta disso, ele costumava dizer que precisávamos agradar o padre. Todos os dias, as 17:55 ele entrava na redação e ordenava: todo mundo pro estúdio!Era hora da ave-maria e ele achava que se rezássemos ali, o padre se agradaria da gente. Terminado ritual, ele acendia um cigarro e resmungava. Foi bom né!

Naquela época não tinha computador. A edição no rádio era na fita rolo. Tinha de cortar, emendar, e colocar na sequência para entrar no ar. Um dia, ele chamou uma entrevista do Cheida que ia lançar um livro de ecologia e entrou o Célio Guergoletto que era vereador na época. Ele saiu do sério e ao vivo descascou todo mundo. Fiquei quietinha na redação e só esperando o sabão. Ao sair, ele ascendeu um cigarro, olhou dentro dos meus olhos e disse calmamente: O que tá acontecendo?

O Paulo tinha um coração enorme. Ao mesmo tempo que esbravejava, ensinava muito. Quando se deparava com um erro de concordância no texto. Meu Deus. Ele sempre me convidava pra cobrir as eleições na CBN, era muito bom. Eu chegava cedo e ele já estava lá, com a equipe distribuída por regiões, os boletins gravados e uma lista enorme com nomes e telefones de autoridades convidadas fazer os comentários . Gostava de sair na frente, dar furos. Um profissionalismo implacável.

No entanto, o que mais me chamava atenção naquele homem era o amor que ele tinha pelo seu filho Bruno. Desde pequeno, o garoto era a paixão dele. A cada encontro, um elogio para aquela criança, adolescente e hoje um homem. Um advogado, dizia ele com o maior orgulho.

Meus passos foram diminuindo. As imagens do passado começaram a desaparecer da minha mente. Logo frente vi dezenas de coroas na porta da câmara que revelavam o carinho dos amigos por este jornalista que partiu nos deixando o seu legado, sua história, sua experiência profissional . Ele sai de cena sem saber se deu Dilma ou Serra, sem votar no amigo Requião e sem se despedir da Elza Correia.

Faz o seguinte Paulo, aproveita e pede pra Deus proibir a morte de jornalista no dia de eleição, pois se assim fosse ainda teríamos você para cobrir mais essa. Mas, como o Poderoso sabe de todas as coisas, só me basta te desejar : Descansa em paz "Índio Véio".

Um comentário:

carina paccola disse...

Elsinha, adorei esse texto em homenagem ao Paulo. Vamos sentir saudades dele. beijos